segunda-feira, maio 29, 2006

Para o porvir

"A saudade, antes mesmo da separação, adoça a amizade com sabor de inestimável." *



Por Euzinha

sexta-feira, maio 26, 2006

Hit Parede, for books





Antecipo aqui o que sempre gosto de dizer: "Um bom título fala por si só". Digo isso, é bom explicar direitinho, para inaugurar aqui um cantinho para os livros, esses amigos sempre tão presentes e companheiros para quem aprecia o metiê. E em homenagem à Arte da Leitura, inicio aqui um novo tópico. O título, creio, fala por si só! :))


Hit Parede

"Os mistérios da Trindade", por Dany-Robert Dufour, Editora Companhia de Freud, ed. 2000.



Breves Comentários: O livro me chamou a atenção, quando de um congresso sobre Direito e Psicanálise, ocorrido em Curitiba, novembro de 2000. Um dos organizadores foi Norberto Irustra, nome ao qual já me referi num post antigo, entitulado 'A janela d'alma'. Nesse congresso, que é o mesmo que dizer congregação, tive o imenso prazer de ser apresentada a grandes idéias, como as professadas por Philip Julien, Enrique Dussel e Dany-Robert Dufour.

Bem, continuando com Dany...

I - Sobre o Dany

Dany-Robert DUFOUR nasceu na França em 1947. É professor na Universidade de Paris 8, onde leciona filosofia da linguagem, da estética e da educação, levando em conta a descoberta freudiana. Trabalha sobre as diferentes formas de simbolização, das quais isolou três: as formas unária, binária e trinitária, operantes em campos de pensamento extremamente diferentes. A publicação, na França, deste livro sobre o binário e o trinitário alcançou grande público entre os psicanalistas lacanianos. Serge Leclaire, em especial, deu ao trabalho uma calorosa acolhida.

II - A dedicatória do livro:


To you...

Eis um bonito trio,
e dizer que tudo isso só faz um,
e que este um não faz nada.

Becket, Nouvelles et textes pour rien


III - A introdução...

"Proponho-me, neste estudo, abordar um tema que irá parecer estranho aos espíritos científicos de hoje. No entanto, este tema parece-me introduzir considerações capitais na história da cultura. O homem é trinitário. Quem diz ‘trinitário’ evoca, decerto, o dogma central da religião cristã, o mistério da Santíssima Trindade. Mas esta árvore imponente e duas vezes milenar não deve ocultar a floresta: tentarei mostrar que a ‘trindade’ existe também, sob formas específicas, nos politeísmos e em outros monoteísmos. E mais: não somente ela é constante no campo narrativo, simbólico e religioso, mas é igualmente identificável como forma filosófica, lógica, lingüística, clínica... Existe um pensamento trinitário que conheceu múltiplas atualizações.
Poderíamos ver neste tema um simples pretexto para exibir uma erudição, divertindo-se com as delícias de um ‘comparativismo ampliado’. De fato, é uma questão de urgência que este tema vai encontrar: o homem trinitário está em vias de desaparecer. O velho homem trinitário, com efeito, está abdicando progressivamente de seus poderes, em benefício de um outro, mais ‘jovem’: o homem binário. O binarismo, apesar de mais recente, tampouco nasceu ontem. Ele é produto de um pensamento nascido na Grécia há mais de 2500 anos, cultivado inicialmente por pequenas sociedades marginais (o pitagorismo, o orfismo...), depois construído como sistema pelo platonismo e desde então levado a suas mais extremas conseqüências com uma coerência rigorosa. A forma binária que domina hoje é o resultado de uma longa evolução, no decorrer do qual forjaram-se as grandes categorias da razão com que se armou o Ocidente: o dualismo, a dialética, a causalidade e, nos dias de hoje, o cálculo binário... Na aurora do século por vir, parece que nosso século terá sido aquele em que o homem binário, depois de uma luta duas vezes milenar com o homem trinitário, apossou-se irreversivelmente das rédeas: não todas, mas quase. Hoje, o homem binário transforma o mundo graças à eficácia inscrita nas redes da binárias das ciências tecnológicas: serve-se da forma algorítmica, quintessência da binariedade (informática, inteligência artificial), para criar em todos os domínios (produção, administração, saúde...) processos artificiais de grande amplitude; ele sabe, de agora em diante, em que língua são escritos os programas naturais do ser vivo (biogenética) e, mal decifrou fragmentos desses programas naturais binários, neles começou a intervir (gênio genético).
Confiando-se ao pensamento binário, mais que ao pensamento trinitário, não se pode simplesmente dizer que o homem esteja hoje mudando de objeto de culto: ele não substituiu os deuses dos politeísmos ou o Deus único dos monoteísmos pelo culto recente das tecnociências binárias. Ele muda de mundo, muda o mundo, muda de representação do mundo, muda de espírito, muda de cultura. Mas, sobretudo, muda a si mesmo. Torna-se outro. Hoje, a enigmática profecia de Zaratustra, lançada há uns cem anos em direção ao nosso século, assume subitamente uma terrível atualidade, extremamente carregada de sentido:

(...) gosto de me assentar sobre igrejas em ruínas
Oh! Como não cobiçaria eu a eternidade (.)
Como caracterizar esses dois homens em luta?

(...) atualizações no decorrer

IV - Introdução, excertos...

"... Não tenho predileção alguma pelas revelações; ao contrário, suspeito dos famosos episódios catárticos da vida espiritual: a noite mística de Pascal de 23 de novembro de 1654... aquele dia de outono de 1882 em que Nietzsche, caminhando pelas montanhas da Riviera italiana do Levante, 'seis mil pés acima do homem e do tempo', descobriu a criança que carregava há dezoito meses, tal como uma 'fêmea de elefante': o Eterno Retorno... a noite do ano de 1946, quando Beckett, perdido na charneca irlandesa, à beira de um cais em plena tempestade, encontrava-se com a sua escrita: uma voz busca, na escuridão, alguém para fazê-lo confessar: sim, EU me lembro... Não sei por quê, mas só apreendo, desses acontecimentos infinitamente pungentes, seu lado grandiloqüente e quase cômico... Se, naquele dia, a coisa trinitária me aparecia, se eu emprestava minha voz ao Outro, é que nos meses precedentes havia trabalhado um pouco além das minhas forças. Ali, diante de Groix, fui tomado pelo riso; mais ainda, quando me voltou à mente um dos artigos do 'Dictionnaire abrangé du surréalisme, de Breton: 'Je suis le devoir du tri-Mystère, tri mystère du Finistère, des Trelendious e des trédious, des trébendious...' , etc. Os caminhos do SENHOR me seriam para sempre impenetráveis... Mais valia decidir esquecer... o tri-mistério do Finistério...

Cinco anos depois, aqui está este livro, entitulado 'Os mistérios da trindade' - notem bem: 'mistérios', no plural, 'santíssima' elidido e 'trindade', em minúsculas. Estou descansado, atualmente isento de qualquer presunção de depressão pós-parto - afecção que atinge numerosos animais intelectuais, do camundongo ao elefante, obrigando-os , após o parto, a se aferrarem de modo tragicômico a asserções tão decisivas quanto cacofônicas. Considero sempre suspeita a cegante claridade das revelações. Não fiz nenhum progresso pessoal na via da salvação eterna. Mas, durante cinco anos, não cessei de construir armadilhas para tentar capturar e identificar a coisa trinitária mal-entrevista no momento em que eu desviava o olhar. E devo dizer que as múltiplas verificações que efetuei, às vezes até a obsessão, para rastrear isso que havia então vagamente percebido, em lugar de me convencerem a cessar de correr atrás de uma quimera, levaram-me finalmente bem mais longe do que teria ido, se soubesse: hoje estou certo de que, se a trindade assombra nossas ciências da linguagem, é simplesmente porque ela se aloja na nossa própria língua. Em uma palavra, digo agora que a língua natural, aquela que vocês e eu falamos todos os dias, é habitada pela trindade . Em outros termos: queiramos ou não, como sujeitos falantes, somos sujeitos do trinitário.

quinta-feira, maio 25, 2006

Bitchology


BITCHOLOGY

No dia 4 de julho de 2005 recebi de uma querida amiga, a Dê, um email. O texto é em inglês e prefi publicá-lo hoje aqui sem tradução da língua materna em que recebi a msg. Isso para preservar certas nuances que uma tradução não alcança.

When I stand up for myself and my beliefs, they call me a bitch.

When I stand up for those I love, they call me a bitch.

When I speak my mind, think my own thoughts or do things my own way,
they call me a bitch.

Being a bitch means I won't compromise what's in my heart. It means I
live my life MY way. It means I won't allow anyone to step on me.

When I refuse to tolerate injustice and speak against it, I am defined
as a bitch.

The same thing happens when I take time for myself instead of being
everyone's maid, or when I act a little selfish.

It means I have the courage and strength to allow myself to be who I
truly am and won't become anyone else's idea of what they think I "should"
be.

I am outspoken, opinionated and determined. I want what I want and
there is nothing wrong with that!

So try to stomp on me, try to douse my inner flame, try to squash
every ounce of beauty I hold within me. You won't succeed.

And if that makes me a bitch, so be it. I embrace the title and am
proud to bear it.




B = Babe
I = In
T = Total
C = Control of
H = Herself

B = Beautiful
I = Intelligent
T = Talented
C = Charming
H = Hell of a Woman

B = Beautiful
I = Individual
T = That
C = Can
H = Handle anything


* Foto tirada no RJ, Baile Funk, Fundição Progresso, Verão de 1997?! Depois confiro se essa fotinho é tãooo antiga assim!


II - Ô Juquinha...

O Juca é um antigo amigo, que conheci dentre inúmeras braçadas, por anos a fio... de fio a pavio! Haja fôlego, Juca, pois já pensou se a palavra "aja-já" cai em desuso?! Af, Maria, Ave, Ave!!

Como sempre, registro aqui, publicamente, o meu eterno amor por você, caríssimo amigo! Pois há amigos que, mesmo longe dos olhos e do contato trivial ou mesmo virtual, nos surpreendem a cada dia, comungando as nossas idéias de todos os santos dias!



[ ]'s Juca

Rumorejando
Pequenas constatações, na falta de maiores

José Zokner (Juca) [27/05/2006]



Constatação I

Desfila,

Na passarela,

Com graciosidade,

Vestida com cetim

De cor carmesim

A linda manequim.

Os chamados

Marmanjos,

Os barbados,

Sentados

Desde a primeira

Até a última

Fila,

A despem

Com olhares cobiçosos,

Sonhando

Com arranjos

Para jantarem,

Se possível,

E de modo indefectível,

Se acostarem

Com ela.

Coitados!

As senhoras,

Cheias de nove horas,

De qualquer idade,

Da penúltima

À décima terceira,

Com olhares invejosos,

Ar de extasiadas,

Ficam imaginando

Que se vestem

E ficam iguais,

Tais e quais

À feminilidade,

A leveza,

A beleza

Dela.

Coitadas!

Constatação II

Deu na mídia: “O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, anunciou uma campanha de seu governo contra o comportamento anti-social, prometendo duras multas para pessoas que tornem a vida de seus vizinhos um inferno, e aos que incomodam os demais com ruídos insuportáveis”. Data vênia, como diriam nossos juristas, porém Rumorejando acha que os bons exemplos devem ser adotados por todos os países, inclusive o nosso, onde não se respeita nada, em geral e, por exemplo, a Lei do Silêncio, em particular.

Constatação III

Ainda que foneticamente soe absolutamente igual, não se pode confundir ascender com acender, muito embora o que se vê de gente ascender por aí, com más intenções, faz a gente acender a ira o que, cá entre nós, não leva a nada, porque entra governo, sai governo e tudo fica na mesma. Exceto, claro, para quem ascender com as retro mencionadas más intenções. A recíproca, dependendo do caso, pode ser verdadeira. Por exemplo, o cidadão, antes de sair, ascender para o segundo pavimento a fim de acender a luz do pátio para mostrar ou dar a impressão que tem gente em casa ou algo assim.

Constatação IV (Coisas, fatos e desculpas da idade provecta).

E como disse o sexagenário, quase septuagenário, pra gatona: “Não posso aceder ao teu gentil convite para ir com você pro motel porque o dever me chama. O dever de ir para casa dormir, se não perco a hora e me dá insônia”.

Constatação V

Não se pode confundir destaque com desataque, muito embora quem preconize um desataque, nesse mundo violento, jamais ficará em destaque, já que aquele, o desataque, nos dias de hoje, praticamente já não existe, pois a violência, que a população tem sofrido, ficou banalizada. A recíproca é, em muitos casos, verdadeira, basta ver, por exemplo, uma gata sair em trajes sumários na rua, ou sem os mesmos para ver o destaque que ela virá a ter. O desataque, certamente, em tal caso, não virá dos moralistas e, muito menos, se ela, a gata, estiver numa praia onde se pratica o naturismo.

Constatação VI (Quadrinha pra ser declamada em festa infantil).

Montei no meu cavalinho de brinquedo

Pra me balançar pra cá e pra lá.

De um coice, não fiquei com medo:

Ele é bonzinho como o meu gato angorá.

Constatação VII

Rico sugere; pobre se intromete.

Constatação VIII

Rico vive em mansão suntuosa; pobre, em choupana despojada.

Constatação IX

Rico leva a fama; pobre, a pecha.

quinta-feira, maio 18, 2006

O ar rarefeito das montanhas influencia a mente de uma forma necessariamente alucinógena?

Sem maiores explicações para o inexplicável, hoje, 19.5.2006, com a devida atualização sobre o tema.


Mas antes, o que deve nos guiar o entendimento: "Nós que ficamos, rogamos para que os nossos corações, repletos de amor e fé, possam nos confortar e nos acalmar. E assim dizer olá aos nossos amigos, amores e familiares que nos antecederam no percurso."







Alpinista brasileiro morre no Monte Everest

Vitor Negrete alcançou topo da montanha mais alta do mundo sem oxigênio. Ele morreu na descida
O alpinista brasileiro Vitor Negrete faleceu nesta sexta-feira após escalar o Monte Everest, no Nepal. Vitor conseguiu atingir a face norte do ponto mais alto do planeta, com 8.860m, sem o auxílio de oxigênio.


O corpo de Vitor foi encontrado na trilha de descida, a aproximadamente 8.300m de altura, por outros alpinistas. O companheiro de Vitor na escalada, Rodrigo Raineri, não estava em boas condições físicas e não tentou o ataque ao cume.

A expedição dos brasileiros entrentou problemas nos últimos dias. O inglês David Sharp, que fazia parte do grupo, morreu na montanha na terça-feira. O malaio Ravi Chandran teve congelamento dos dedos das mãos e desceu para receber atendimento médico.

- Todos estes acontecimentos me abalaram muito e pensei seriamente em desistir e descer. Mas o Ravi disse-me para fazer cume por eles - disse Negrete na terça-feira.

Na quarta-feira, Negrete decidiu subir, dispensando o apoio do guia local e sem o auxílio de oxigênio.

- Estou subindo totalmente só. Prometo que tomarei muito cuidado - disse Negrete.

Globo Online


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Hoje (18.5.2006) reproduzo aqui, infelizmente ainda sem as fotos, uma reportagem sobre um incidente que atravessou a vida de muitos. E, felizmente graças à ações de graça, poderá sempre ensinar a muitos.


Em breve prometo trazer aqui fotos digníssimas e respeitabilíssimas ao que há de mais belo em nós, acessível a todos aqueles que já conseguiram desvelar o reflexo dessa beleza dispersa nessa toda natureza que nos cerca.

Enjoy, por hora, apenas em palavras. Logo logo virão as imagens, que dizem muito mais do que quaisquer palavras.

Aviso prévio: as imagens possuem forte conteúdo alucinógeno, razão pela qual recomenda-se não serem visualisadas por menores de 18 anos e por todos os que são veemente contra substâncias de qualquer natureza que tenham esse condão de modificar a realidade, colorindo e alucinando sobremaneira o jeito a que estamos acostumados a ver a vida como a gente sempre achou que ela é.

Se quiserem arriscar, acessem então. Mas não digam que eu, como mui amiga, não avisei :))

http://picasaweb.google.com/dalinho1


Bacci :))



Recordar sempre, e como dizia nosso ja saudoso Renato Russo, "..é tão estranho os bons morrem jovens."

Tragédia anunciada (11/02/98)
Alpinistas brasileiros desafiam conselhos e adversidades e morrem em avalanche nos Andes
Roberta Paixão, de Puente del Inca


A última foto: Ronaldo, Alexandre, Mozart, Dálio e Othon posam ao pé do Aconcágua

Faltavam poucos minutos para as 8 horas da noite de terça-feira, o sol ainda brilhava forte sobre a Cordilheira dos Andes, quando o rádio VHF do montanhista paranaense Dálio Zippin Neto, 30 anos, começou a emitir ruídos. Deitado dentro de uma barraca cravada sobre uma plataforma de gelo, a 4.000 metros nas encostas do Monte Aconcágua, na fronteira da Argentina com o Chile, Dalio estremeceu ao atender ao chamado. "Por favor, alguém nos ajude, houve um acidente grave", gritava do outro lado Othon Leonardos, um brasiliense de 23 anos. "O Mozart morreu! O Mozart morreu!", repetia. "O Alexandre está lá embaixo!"

Naquele momento, Othon estava pendurado sobre um abismo, seguro apenas por uma corda que lhe estraçalhava os músculos da perna. Abaixo dele, dois outros montanhistas os cariocas Mozart Catão e Alexandre Oliveira estavam mortos. Os três foram colhidos por uma avalanche de pedras e gelo quando tentavam alcançar o cume do Aconcágua, a montanha mais alta da América do Sul, com 6.959 metros. Quando o acidente aconteceu, Othon, Mozart e Alexandre estavam a 6.150 metros, a apenas 800 metros de seu objetivo. Dálio e outro integrante da expedição, o também paranaense Ronaldo Frazen Júnior, tinham ficado no acampamento-base, a 6 quilômetros de distância, e se salvaram.

Quando a avalanche aconteceu, Mozart e Alexandre foram arrastados montanha abaixo. Othon ficou pendurado por uma corda de 60 metros com o corpo virado para o paredão gelado. Nessa posição, conseguiu pegar o rádio na mochila e discar o número 142800, a freqüência do Parque Provincial do Aconcágua, na qual seus companheiros do acompamento-base estavam sintonizados. Suspenso sobre o abismo, com as pernas quebradas pelo impacto da corda na hora da avalanche, ele ainda conversou com Dálio e Ronaldo pelo rádio durante duas horas e meia. Depois morreu congelado. "Quando o rádio parou de fazer ruído, por volta das 22h30, percebi que não havia mais esperança", contou Dálio a VEJA no vilerajo argentino de Puente del Inca, situado na base do Aconcágua, na última sexta-feira. "Antes de morrer, ele me pediu para dizer ao pai e à mãe que os amava. Também pediu que tomássemos uma garrafa de vinho por ele. Depois ficou em silêncio."

Imprudência O que produziu a tragédia da semana passada nos Andes foi em boa parte resultado da imprudência. Os cinco brasileiros tinham ido aos Andes com a missão de escalar o Aconcágua pela chamada face sul. É um percurso considerado muito perigoso, não tanto pelo esforço exigido na escalada, mas pelos riscos que envolve. O trecho em que se encontravam os alpinistas é uma parede vertical de rocha e gelo açoitada por ventos fortíssimos. À noite, a temperatura cai para 30 graus negativos. O pior são as avalanches. Nesta época do ano, elas acontecem ao ritmo de dez por dia, o que torna qualquer tentativa de chegar ao topo um desafio extremamente arriscado.

Além do gosto puro e simples pela aventura, os brasileiros estavam no Aconcágua motivados pelo dinheiro do patrocínio. Mozart Catão, o chefe da expedição, tinha um contrato de 90.000 reais com a Petrobrás pelo qual se comprometia a divulgar o nome da empresa em todas as aparições em fotos e vídeos. Pelos termos do contrato, ele recebeu parte do dinheiro antes de partir. A outra receberia só na volta, com a condição de conseguir chegar ao topo da montanha. "Nós queremos retorno em mídia, se a expedição não vai para a frente nós cancelamos o contrato", diz Milton Costa Filho, coordenador de projetos internacionais da Petrobrás. "Quando chegamos a Mendoza, na Argentina, o Litos Sandres, um montanhista que já fez a face sul, recomendou que não fossemos", conta o sobrevivente Dálio. "Disse que seria uma roleta-russa. Mas o Mozart queria porque daria mais divulgação."

Rivalidade Dos três alpinistas mortos, Mozart era o mais experiente. Tinha sido o primeiro brasileiro a chegar ao topo do Monte Everest, a montanha mais alta da Terra, em 1995. A façanha foi realizada junto com o paranaense Waldemar Niclevicz, mas os dois brigaram logo depois de descer do Everest. Rivais desde então, estavam envolvidos numa corrida na qual cada um pretendia ser o primeiro brasileiro a escalar o ponto mais alto de cada um dos sete continentes. Waldemar havia completado o desafio em novembro do ano passado, ao escalar o Monte Carstenz, na Indonésia. Mozart, que não tinha conseguido autorização do governo indonésio para escalar o Carstenz também a única montanha que lhe faltava , decidiu dar o troco propondo ao seu patrocinador o projeto para se tornar o primeiro brasileiro a superar a face sul do Aconcágua. "O que matou Mozart foi a disputa que ele travava com o desafeto Waldemar Niclevicz", diz o empresário Oskar Metsavaht, amigo de Mozart.

Desde 1926, ano em que a estatística começou a ser feita, o Aconcágua já matou 85 montanhistas 79 homens e seis mulheres. Somente nesta temporada, que começou em novembro e vai até o fim de fevereiro, morreram oito. Entre as vítimas está o capitão do Exército brasileiro Vércio Yudi Fujihara, 37 anos. Ele desapareceu no início de janeiro, quando subia a Rota dos Polacos, na face leste. Fazia parte de uma equipe de três montanhistas. No meio da escalada, o mau tempo fez com que seus dois companheiros desistissem. Fujihara continuou sozinho e nunca mais foi visto. Nos últimos sete anos, a afluência de visitantes ao Aconcágua tem crescido cada vez mais. "O problema é que virou moda", reclama Pablo Perelló, chefe da guarda do parque onde está situada a montanha. "As agências de turismo vendem o monte como lugar de trekking. E ele não serve para isso." Das 2.800 pessoas que passaram por lá neste ano, apenas onze se aventuraram pelas escarpas da face sul. Entre elas estão os três brasileiros mortos na semana passada.


Foto: Divulgação Foto: Roberto Jayme
Mozart Catão, no Everest, e com Niclevicz, em Brasília: façanha e rivalidade

Corpos de alpinistas não serão resgatados
Companheiros de escalada deram depoimentos sobre o alpinista Waldemar Niclevicz
Ele foi o primeiro ...


O primeiro alpinista a chegar, oficialmente, ao cume do Aconcágua foi Matthias Zurbriggen, em 1897. Existem, no entanto, evidências arqueológicas de que suas trilhas eram freqüentadas por tribos indígenas da região, como os aimarás e os incas. Estes últimos deram à montanha o nome de Aconcahua, que em quíchua quer dizer sentinela branca. Existem três maneiras de atingir o cume da montanha: pelas faces oeste, leste e sul. As duas primeiras são as mais fáceis e numa delas praticamente não há escalada. Chega-se ao pico caminhando. A face sul é diferente. O trajeto alterna geleiras o ano inteiro, inclusive no verão, com trechos em rocha. "As técnicas e equipamentos para escalada em rocha e em neve são muito diferentes, e essa mistura torna a face sul muito complicada", diz o paulista Luiz Alberto Martinez, que há dez anos escalou o Aconcágua.

Tontura e vômito O maior perigo, no entanto, são as mudanças bruscas no clima. A montanha é continuamente varrida por ventos de mais de 200 quilômetros horários e, neste ano, em função do El Niño, as geleiras no topo estão muito instáveis, resultando em freqüentes avalanches. O paulista Luiz Makoto Ishibe, 37 anos, um dos mais experientes montanhistas brasileiros, conta que esteve na face sul do Aconcágua duas vezes, mas cancelou a subida por causa do mau tempo. Numa das ocasiões, esperou dez dias até que os ventos amainassem. "Não existe escalada com hora marcada", diz ele. "A montanha não tem horário. Se entrar mau tempo, não se enfrenta a montanha, simplesmente se espera." Antes da viagem dos cinco brasileiros à Argentina, Makoto conversou com Ronaldo Frazen, seu amigo, e aconselhou-o a não continuar a aventura se estivesse nevando. Ronaldo desistiu da subida e salvou-se. Waldemar Niclevicz também esteve duas vezes na face sul do Aconcágua e não chegou ao topo. As tentativas terminaram sempre debaixo de impressionantes tempestades de neve. "Para subir a face sul é preciso que o tempo esteja muito bom", diz Niclevicz. "Não pode haver nevasca nem sol forte."

Dálio e Ronaldo, os dois sobreviventes da tragédia, contam que desistiram de ir até o topo quatro dias antes porque não conseguiram se aclimatar à altitude. "Comecei a sentir tonturas e ânsia de vômito e percebi que não conseguiria ir até o fim", conta Dálio. No momento do acidente, Mozart, Alexandre e Othon estavam na Rampa Messner, um platô de gelo, onde montariam o acampamento para passar a noite e tentar vencer os 800 metros finais no dia seguinte. Ao ouvir o chamado de Othon pelo rádio, depois do acidente, Dálio e Ronaldo pediram ajuda à polícia da montanha. Foram informados de que, àquela hora da noite, não havia meios de levar nenhum socorro ao local. Sem alternativa, os dois ficaram tentando animar o companheiro pelo rádio. "Falamos para ele tentar pegar na mochila o saco de dormir e o bivaque, um isolante térmico", conta Ronaldo Frazen. "Ele pegou, mas não conseguiu colocá-lo e jogou a mochila fora." Com o cair da noite, por volta de 9 horas, o frio aumentou. Nesse momento, Othon relatou que já não sentia os pés e as pernas congeladas. "Depois ele foi ficando cada vez mais cansado e sua voz foi sumindo", contou Ronaldo na sexta-feira. "No dia seguinte, ainda dava para ver de binóculo dois pontos amarelos na montanha. Eram as roupas deles sobre o gelo."

Manobra fatal
A cada verão europeu, os Alpes transformam-se num parque de diversões mortal. Sessenta pessoas, em média, morrem a cada temporada escalando montanhas. A maioria dos acidentes é causada por imprudência dos montanhistas. Nada se compara, no entanto, à tragédia ocorrida na última terça-feira na estação de inverno de Cavalese, na província de Trento, norte da Itália. Em vôo rasante, um avião da Marinha americana se chocou com os cabos de aço que sustentavam o teleférico da estação, causando a morte de vinte turistas. O avião, um EA-6B Prowler, voava a apenas 90 metros do chão, desrespeitando as regras de segurança para vôos de treinamento, que estipulam altura mínima de 300 metros do solo naquela região. Os vinte mortos estavam na cabine do teleférico que os levava ao topo da montanha. Uma segunda cabine, que fazia a descida só com o condutor, ficou pendurada por uma hora até a chegada do helicóptero de resgate. O avião americano tinha decolado da Base Aérea de Aviano, localizada entre Veneza e Belluno, em missão de treinamento, levando o piloto e três técnicos. Depois do desastre, foi recolhido para um hangar da base de Aviano, onde está sendo vigiado por fuzileiros navais americanos e guardas italianos. Apesar do choque com os cabos de aço, o aparelho sofreu apenas pequenas avarias na parte superior da cauda, o que indica as manobras do piloto para cruzar a estrutura do teleférico por baixo.


Com reportagem de Altair Thury Filho,
do Rio de Janeiro, Franco Iacomini, de Curitiba,
e Maurício Cardoso, de São Paulo

Fotos que aparecem nesse post tiradas e publicadas por Dalio Zippin Neto.

A primeira e a terceira fotos foram tiradas quando do curso Wilderness First , em Tumalo State Park, Painted Hills, Smith Rocks, tudo isso na região do Central Oregon, Bend/Redmond e publicadas pelo autor em maio de 2006. O segundo click foi feito em Chalten 2, Patagônia, Argentina, fevereiro de 2006.