Superior Tribunal de Justiça diminui multa de prefeito que tentou cassar o carnaval.
"Quando era prefeito de Itapira, no estado de São Paulo, João Antônio Barros Munhoz não gostou quando seus convidados foram barrados num baile de carnaval. Ficou tão aborrecido que cassou o alvará de funcionamento do clube onde ocorriam as festividades e ordenou que servidores da prefeitura cavassem valetas nas estradas de acesso ao estabelecimento. A represália do prefeito rendeu uma ação de improbidade administrativa e uma multa de 50 vezes o valor da remuneração de prefeito. O processo chegou ao STJ e foi relatado pelo ministro João Otávio de Noronha, que decidiu baixar a multa. A decisão foi seguida unanimemente pela Segunda Turma do Tribunal.
Em 1998, o prefeito João Antônio tentou entrar num baile de carnaval com vários convidados que não estavam na lista. O porteiro do clube não permitiu a entrada e se iniciou um bate-boca. Posteriormente um dos diretores do estabelecimento autorizou a entrada, mas o prefeito se recusou a entrar. No dia seguinte, João Antônio cassou o alvará de funcionamento do clube. O baile ainda foi realizado graças a um mandado de segurança. O prefeito, então, ordenou que servidores da prefeitura abrissem valetas nas estradas de acesso ao clube.
O Ministério Público de São Paulo entrou com uma ação pública contra João Antônio, por improbidade administrativa, desvio de finalidade e mau uso de recursos públicos. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) aplicou uma multa de 50 vezes a remuneração que ele recebia quando era prefeito e suspendeu seus direitos políticos. A defesa do réu alegou que a punição era desproporcional ao ato, já que o prejuízo ficou em torno de R$ 3 mil e a multa chegaria a 230 vezes esse valor. Além de o dano ser de pequena monta, o ex-prefeito não teria tido nenhum ganho financeiro com a ação.
Em seu voto, o ministro Noronha criticou a postura do ex-prefeito, destacando que a vingança era um sentimento menos nobre no ser humano e que uma autoridade pública deveria se portar com mais brio. Entretanto, seguindo o princípio da proporcionalidade, ele admitiu ser o valor da multa realmente excessivo e fixou o valor em 10 vezes a remuneração do prefeito. O ministro Herman Benjamim destacou a gravidade da questão do desvio de finalidade e do mau uso da máquina pública, mas acompanhou o voto do relator."
Autor(a):Fabrício Azevedo
REsp 897499/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 2ª Turma de Direito Público/STJ.
Ação Civil Pública - Improbidade Administrativa - Prefeito / Ex-Prefeito , retirado do site www.stj.gov.br, em 29/03/2007.
sexta-feira, março 30, 2007
terça-feira, março 20, 2007
O princípio da legalidade para leigos
- E aí, tu vives? E se sim, vamos lá: como vives?
- Vivo bem, vivo legal.
- Legal, de um jeito legal?
- Legalmente, dentro da legalidade, é isso que quis dizer.
- Sei, entendi. De um jeito legal para ti, de um jeito legal para mim. Para mim isso é que é viver legalmente. Estou errada?
- Bem, nunca pensei assim, mas escutando tu dizeres assim, bem... nunca pensei assim...
- Sei... mas e daí, legal ou não legal? O que é diferente de legal e ilegal...até onde sei...ou já não mais?
- Ouvi dizer que há quem diga que viraram sinônimos, de tão confundidos que ficaram um com o outro.
- Quem?
- Esse legal e esse ilegal.
- Aí já não sei... ou será que sei?
- Eu acho que tu sempre soubes...
- Tem horas que acho que sei, outras que já não sei mais ...
- Sei... tu não sabes que sabes?
- Se me contas assim, quem sabe agora eu saiba melhor...
- Sei...
No outro dia, continuando com o tête-à-tête, que em português é quase como dizer tititi:
- Estive pensando na nossa conversa de ontem, sobre o saber e o não saber...
- Saber o que mesmo?
- Sobre esses boatos de que o legal e o ilegal estão virando sinônimos, de tão confundidos que andam um com o outro...
- Para que perder tempo com isso, se é só abrir o dicionário da língua portuguesa? Só consigo relevar essas suas perdas-de-tempo se lembrar dessa tal de diferença biológica dos sexos.
- Mas lá no dicionário não diz que legal é sinônimo de ilegal. Aposto sem abri-lo...
- Continue, por favor... sem apostas.
- Tá, mas só se você prometer que nunca vai esquecer da premissa do meu raciocínio: que a culpa não é do povão brasileiro.
- Como? Continue, por favor...
- Legal é um adjetivo que provém do latim legale, que quer dizer relativo à lei. Só que na história da nossa língua, criou-se mais um significado para legal, que no jargão popular quer dizer alguém, ou mesmo algo, que tem a qualidade de ser ótimo, excelente, leal, digno, bacana mesmo, sabe como?
- E eu lá quero saber o que diz a língua inculta?
- Mas não foi você quem mencionou que alguns letrados arriscam a dizer que o legal e o ilegal estão querendo infringir a lei da antinomia da língua, para virar sinônimos? Veja lá o que diz o Aurélio, um dos pai-de-burros mais famosos por essas terras: “palavra-ônibus que exprime numerosas idéias apreciativas...”!
- E desde quando palavra virou ônibus, nunca ouvi algo tão estapafúrdio!
- Você vai entender quando aprender a viajar pelas incríveis metamorfoses da língua...
- Sei...
- Eu sei. E você, será que sabe?
- Vivo bem, vivo legal.
- Legal, de um jeito legal?
- Legalmente, dentro da legalidade, é isso que quis dizer.
- Sei, entendi. De um jeito legal para ti, de um jeito legal para mim. Para mim isso é que é viver legalmente. Estou errada?
- Bem, nunca pensei assim, mas escutando tu dizeres assim, bem... nunca pensei assim...
- Sei... mas e daí, legal ou não legal? O que é diferente de legal e ilegal...até onde sei...ou já não mais?
- Ouvi dizer que há quem diga que viraram sinônimos, de tão confundidos que ficaram um com o outro.
- Quem?
- Esse legal e esse ilegal.
- Aí já não sei... ou será que sei?
- Eu acho que tu sempre soubes...
- Tem horas que acho que sei, outras que já não sei mais ...
- Sei... tu não sabes que sabes?
- Se me contas assim, quem sabe agora eu saiba melhor...
- Sei...
No outro dia, continuando com o tête-à-tête, que em português é quase como dizer tititi:
- Estive pensando na nossa conversa de ontem, sobre o saber e o não saber...
- Saber o que mesmo?
- Sobre esses boatos de que o legal e o ilegal estão virando sinônimos, de tão confundidos que andam um com o outro...
- Para que perder tempo com isso, se é só abrir o dicionário da língua portuguesa? Só consigo relevar essas suas perdas-de-tempo se lembrar dessa tal de diferença biológica dos sexos.
- Mas lá no dicionário não diz que legal é sinônimo de ilegal. Aposto sem abri-lo...
- Continue, por favor... sem apostas.
- Tá, mas só se você prometer que nunca vai esquecer da premissa do meu raciocínio: que a culpa não é do povão brasileiro.
- Como? Continue, por favor...
- Legal é um adjetivo que provém do latim legale, que quer dizer relativo à lei. Só que na história da nossa língua, criou-se mais um significado para legal, que no jargão popular quer dizer alguém, ou mesmo algo, que tem a qualidade de ser ótimo, excelente, leal, digno, bacana mesmo, sabe como?
- E eu lá quero saber o que diz a língua inculta?
- Mas não foi você quem mencionou que alguns letrados arriscam a dizer que o legal e o ilegal estão querendo infringir a lei da antinomia da língua, para virar sinônimos? Veja lá o que diz o Aurélio, um dos pai-de-burros mais famosos por essas terras: “palavra-ônibus que exprime numerosas idéias apreciativas...”!
- E desde quando palavra virou ônibus, nunca ouvi algo tão estapafúrdio!
- Você vai entender quando aprender a viajar pelas incríveis metamorfoses da língua...
- Sei...
- Eu sei. E você, será que sabe?
* A foto não sei quem produziu, foi-me enviada por email por um amigo: um amigo que fala comigo! A foto, ao que tudo indica, foi retirada do site http://patodelaranja.com/
Enjoy, saboreie dentro do seu melhor paladar!
Agradecimento à Telegramática, serviço disponibilizado pela Prefeitura Municipal de Curitiba (tel. 041-3218-2425), através do qual são designados quatro professores de português, com formação superior, da rede municipal de ensino, para atender às dúvidas gramaticais da população local, gratuitamente. Isso, para mim, é um legal legal. Aliás, tão redundantemente legal, que mereceria ser escrito assim: legal², que é o mesmo que dizer legal ao quadrado. Se eu quiser dizer a mesma coisa, na linguagem juridicamente técnica, posso optar pela expressão latina bis in idem, ou seja: o legal, aqui, incide duas vezes... e por isso mesmo um legal legítimo.
quinta-feira, março 01, 2007
Cadios
Ao me despedir da justa metade do ser balzaquiana, brindei minha passagem com uma brincadeira de palavras. Não quis passar minha trajetória em brancas nuvens, sem uma contribuição sequer para a minha língua.
Foi em um sábado fim-de-tarde, quando peguei para me distrair um livro em cima de um balcão de bar, que naquele instante jamais poderia imaginar que faria parte da minha vida: as 101 coisas que você precisa fazer antes de morrer. Foi ali que o acaso abriu na página que desafiava: inventar uma palavra. Pedi o livro emprestado ao dono do boteco-restauranteria, mas se não devolver não tem problema, a livraria não cobra, deixa livros aqui e acolá, trocados mensalmente, para divulgar o hábito da leitura.
Inventar uma palavra é fácil. O que distingue esses inventores de nomes feito Sheakspeare, porém, é o dom de despertar no interlocutor um sentimento genuíno que o faça repetir: a mesma palavra. E de tanta repetição dá-se o fenômeno da criação e também de mutação da língua.
Eu quis escrever cadios, mas essa palavra não existia para adjetivar esses tais calafrios. Talvez existisse alguma outra para dizer o mesmo, uma palavra terminada em ditongo 'io'? Tentei vadio, mas voltei ao cadio, pois queria algo mais bravio.
Palavra nova, sensações antigas: aqui, um sentimento cadio descrito por Mário de Sá-Carneiro, no exato contra-ponto de dois poemas. Uma sensação incerta, não se sabe direito o que a provoca e como defini-la, mas de alguma forma sabe-se a certa, como uma estrela, a nos indicar o rumo.
Confira.
Além-tédio
Nada me expira já, nada me vive —
Nem a tristeza nem as horas belas.
De as não ter e de nunca vir a tê-las,
Fartam-me até as coisas que não tive.
Como eu quisera, enfim de alma esquecida,
Dormir em paz num leito de hospital…
Cansei dentro de mim, cansei a vida
De tanto a divagar em luz irreal.
Outrora imaginei escalar os céus
À força de ambição e nostalgia,
E doente-de-Novo, fui-me Deus
No grande rastro fulvo que me ardia.
Parti. Mas logo regressei à dor,
Pois tudo me ruiu… Tudo era igual:
A quimera, cingida, era real,
A própria maravilha tinha cor!
Ecoando-me em silêncio, a noite escura
Baixou-me assim na queda sem remédio;
Eu próprio me traguei na profundura,
Me sequei todo, endureci de tédio.
E só me resta hoje uma alegria:
É que, de tão iguais e tão vazios,
Os instantes me esvoam dia a dia
Cada vez mais velozes, mais esguios…
Mário de Sá-Carneiro
Ápice
O raio do sol da tarde
Que uma janela perdida
Refletiu
Num instante indiferente —
Arde,
Numa lembrança esvaída,
À minha memória de hoje
Subitamente…
Seu efêmero arrepio
Ziguezagueia, ondula, foge,
Pela minha retentiva…
— E não poder adivinhar
Porque mistério se me evoca
Esta idéia fugitiva,
Tão débil que mal me toca!…
-Ah, não sei porquê, mas certamente
Aquele raio cadente
Alguma coisa foi na minha sorte
Que a sua projeção atravessou…
Tanto segredo no destino de uma vida…
É como a idéia de Norte,
Preconcebida,
Que sempre me acompanhou…
Mário de Sá Carneiro
Quando invento, não me rendo à arte solitária. Servem-me de inspiração Sheakspeare e, para um aproach mais tupiniquim, lembro do crackear, verbo inventado por Oswald de Andrade, licença poética para ficar na memória.
E para terminar, depois da poesia, fique com um pouquinho de antropofagia, por Oswald de Andrade, cujo manifesto antropofágico você poderá ler na íntegra no post 'A saída antropofágica da poesia'.
Memórias Sentimentais de João Miramar
Verbo Crackar*
Eu empobreço de repente
Tu enriqueces por minha causa
Ele azula para o sertão
Nós entramos em concordata
Vós protestais por preferência
Eles escafedem a massa
Sê pirata
Sede trouxas
Abrindo o pala
Pessoal sarado.
Oxalá eu tivesse sabido que esse verbo era irregular.
(* verbo inventado, baseado no crack da Bolsa de Nova York em 1929)
fontes: www.wikedia.com e http://www.lumiarte.com/luardeoutono/oswald/index.html. As justas referências ao autor do livro que me fez tomar a decisão de ficar com o termo 'cadio' virão oportunamente, assim que localizar onde é que larguei o talzinho... do livro.
Foi em um sábado fim-de-tarde, quando peguei para me distrair um livro em cima de um balcão de bar, que naquele instante jamais poderia imaginar que faria parte da minha vida: as 101 coisas que você precisa fazer antes de morrer. Foi ali que o acaso abriu na página que desafiava: inventar uma palavra. Pedi o livro emprestado ao dono do boteco-restauranteria, mas se não devolver não tem problema, a livraria não cobra, deixa livros aqui e acolá, trocados mensalmente, para divulgar o hábito da leitura.
Inventar uma palavra é fácil. O que distingue esses inventores de nomes feito Sheakspeare, porém, é o dom de despertar no interlocutor um sentimento genuíno que o faça repetir: a mesma palavra. E de tanta repetição dá-se o fenômeno da criação e também de mutação da língua.
Eu quis escrever cadios, mas essa palavra não existia para adjetivar esses tais calafrios. Talvez existisse alguma outra para dizer o mesmo, uma palavra terminada em ditongo 'io'? Tentei vadio, mas voltei ao cadio, pois queria algo mais bravio.
Palavra nova, sensações antigas: aqui, um sentimento cadio descrito por Mário de Sá-Carneiro, no exato contra-ponto de dois poemas. Uma sensação incerta, não se sabe direito o que a provoca e como defini-la, mas de alguma forma sabe-se a certa, como uma estrela, a nos indicar o rumo.
Confira.
Além-tédio
Nada me expira já, nada me vive —
Nem a tristeza nem as horas belas.
De as não ter e de nunca vir a tê-las,
Fartam-me até as coisas que não tive.
Como eu quisera, enfim de alma esquecida,
Dormir em paz num leito de hospital…
Cansei dentro de mim, cansei a vida
De tanto a divagar em luz irreal.
Outrora imaginei escalar os céus
À força de ambição e nostalgia,
E doente-de-Novo, fui-me Deus
No grande rastro fulvo que me ardia.
Parti. Mas logo regressei à dor,
Pois tudo me ruiu… Tudo era igual:
A quimera, cingida, era real,
A própria maravilha tinha cor!
Ecoando-me em silêncio, a noite escura
Baixou-me assim na queda sem remédio;
Eu próprio me traguei na profundura,
Me sequei todo, endureci de tédio.
E só me resta hoje uma alegria:
É que, de tão iguais e tão vazios,
Os instantes me esvoam dia a dia
Cada vez mais velozes, mais esguios…
Mário de Sá-Carneiro
Ápice
O raio do sol da tarde
Que uma janela perdida
Refletiu
Num instante indiferente —
Arde,
Numa lembrança esvaída,
À minha memória de hoje
Subitamente…
Seu efêmero arrepio
Ziguezagueia, ondula, foge,
Pela minha retentiva…
— E não poder adivinhar
Porque mistério se me evoca
Esta idéia fugitiva,
Tão débil que mal me toca!…
-Ah, não sei porquê, mas certamente
Aquele raio cadente
Alguma coisa foi na minha sorte
Que a sua projeção atravessou…
Tanto segredo no destino de uma vida…
É como a idéia de Norte,
Preconcebida,
Que sempre me acompanhou…
Mário de Sá Carneiro
Quando invento, não me rendo à arte solitária. Servem-me de inspiração Sheakspeare e, para um aproach mais tupiniquim, lembro do crackear, verbo inventado por Oswald de Andrade, licença poética para ficar na memória.
E para terminar, depois da poesia, fique com um pouquinho de antropofagia, por Oswald de Andrade, cujo manifesto antropofágico você poderá ler na íntegra no post 'A saída antropofágica da poesia'.
Memórias Sentimentais de João Miramar
Verbo Crackar*
Eu empobreço de repente
Tu enriqueces por minha causa
Ele azula para o sertão
Nós entramos em concordata
Vós protestais por preferência
Eles escafedem a massa
Sê pirata
Sede trouxas
Abrindo o pala
Pessoal sarado.
Oxalá eu tivesse sabido que esse verbo era irregular.
(* verbo inventado, baseado no crack da Bolsa de Nova York em 1929)
fontes: www.wikedia.com e http://www.lumiarte.com/luardeoutono/oswald/index.html. As justas referências ao autor do livro que me fez tomar a decisão de ficar com o termo 'cadio' virão oportunamente, assim que localizar onde é que larguei o talzinho... do livro.
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