terça-feira, março 20, 2007

O princípio da legalidade para leigos


- E aí, tu vives? E se sim, vamos lá: como vives?
- Vivo bem, vivo legal.
- Legal, de um jeito legal?
- Legalmente, dentro da legalidade, é isso que quis dizer.
- Sei, entendi. De um jeito legal para ti, de um jeito legal para mim. Para mim isso é que é viver legalmente. Estou errada?
- Bem, nunca pensei assim, mas escutando tu dizeres assim, bem... nunca pensei assim...
- Sei... mas e daí, legal ou não legal? O que é diferente de legal e ilegal...até onde sei...ou já não mais?
- Ouvi dizer que há quem diga que viraram sinônimos, de tão confundidos que ficaram um com o outro.
- Quem?
- Esse legal e esse ilegal.
- Aí já não sei... ou será que sei?
- Eu acho que tu sempre soubes...
- Tem horas que acho que sei, outras que já não sei mais ...
- Sei... tu não sabes que sabes?
- Se me contas assim, quem sabe agora eu saiba melhor...
- Sei...

No outro dia, continuando com o tête-à-tête, que em português é quase como dizer tititi:

- Estive pensando na nossa conversa de ontem, sobre o saber e o não saber...
- Saber o que mesmo?
- Sobre esses boatos de que o legal e o ilegal estão virando sinônimos, de tão confundidos que andam um com o outro...
- Para que perder tempo com isso, se é só abrir o dicionário da língua portuguesa? Só consigo relevar essas suas perdas-de-tempo se lembrar dessa tal de diferença biológica dos sexos.
- Mas lá no dicionário não diz que legal é sinônimo de ilegal. Aposto sem abri-lo...
- Continue, por favor... sem apostas.
- Tá, mas só se você prometer que nunca vai esquecer da premissa do meu raciocínio: que a culpa não é do povão brasileiro.
- Como? Continue, por favor...
- Legal é um adjetivo que provém do latim legale, que quer dizer relativo à lei. Só que na história da nossa língua, criou-se mais um significado para legal, que no jargão popular quer dizer alguém, ou mesmo algo, que tem a qualidade de ser ótimo, excelente, leal, digno, bacana mesmo, sabe como?
- E eu lá quero saber o que diz a língua inculta?
- Mas não foi você quem mencionou que alguns letrados arriscam a dizer que o legal e o ilegal estão querendo infringir a lei da antinomia da língua, para virar sinônimos? Veja lá o que diz o Aurélio, um dos pai-de-burros mais famosos por essas terras: “palavra-ônibus que exprime numerosas idéias apreciativas...”!
- E desde quando palavra virou ônibus, nunca ouvi algo tão estapafúrdio!
- Você vai entender quando aprender a viajar pelas incríveis metamorfoses da língua...
- Sei...
- Eu sei. E você, será que sabe?






* A foto não sei quem produziu, foi-me enviada por email por um amigo: um amigo que fala comigo! A foto, ao que tudo indica, foi retirada do site http://patodelaranja.com/
Enjoy, saboreie dentro do seu melhor paladar!


Agradecimento à Telegramática, serviço disponibilizado pela Prefeitura Municipal de Curitiba (tel. 041-3218-2425), através do qual são designados quatro professores de português, com formação superior, da rede municipal de ensino, para atender às dúvidas gramaticais da população local, gratuitamente. Isso, para mim, é um legal legal. Aliás, tão redundantemente legal, que mereceria ser escrito assim: legal², que é o mesmo que dizer legal ao quadrado. Se eu quiser dizer a mesma coisa, na linguagem juridicamente técnica, posso optar pela expressão latina bis in idem, ou seja: o legal, aqui, incide duas vezes... e por isso mesmo um legal legítimo.

Um comentário:

Cláudia disse...

Há quem sempre me afirme que escrever bem é cortar palavras. Via de regra, um quem de contos, um quem masculino. Um masculino que fala menos do que um feminino. Esse, um quem prosaico? Bem, escrever aqui me faz feliz, mais do que se tomasse 'prosac'. ;)