segunda-feira, junho 09, 2008
A imagem fala por si só?
Sempre gosto de brincar que um bom título fala por si mesmo. Mas um título já é algo nominável, que adentrou no mundo da linguagem. E as imagens? Será que dizem, em símbolo, do que se encontra para mais além, no lugar do indizível?
Fotos, para antecipar algum dizer sobre o que não se diz! Enfim, talvez seja a hora de arriscar jogar com a perversão, tão em voga em nosso contexto da modernidade. De conversar com Ulrich, o herói do romance Der Mann Ohne Eigenschaften, de Robert Musil: o homem sem qualidades, aquele que, não tendo qualidades herdadas, adquiridas ou mesmo incoporadas, produziu-se por si mesmo, mas de uma forma tênue e mutável, dado que suas qualidades não podiam perdurar frente ao seu entorno, que mudava com uma rapidez imprevisível. E assim se encontra o cidadão de nossa líquida sociedade moderna, nas palavras de Zygmunt Bauman, prefaciando "Amor Líquido", Editora Zahar, pás. 7/8.
"Não tendo ligações indissolúveis e definitivas, o herói de seu livro - o cidadão de nossa líquida sociedade moderna - e seus atuais sucessores são obrigados a amarrar um ao outro, por iniciativa, habilidades e dedicação próprias, os laços que porventura pretendam usar com o restante da humanidade. Desligados, precisam conectar-se... Nenhuma das conexões que venham a preencher a lacuna deixada pelos vínculos ausentes ou obsoletos tem, contudo, a garantia da permanência. De qualquer modo, eles só precisam ser frouxamente atados, para que possam ser outra vez desfeitos, sem grandes delongas, quando os cenários mudarem - o que, na modernidade líquida, decerto ocorrerá repetidas vezes".
"Carecendo da visão aguda de Musil, tanto quanto da riqueza de sua palheta e da sutileza de suas pinceladas - de fato, de quaisquer dos requintados talentos que fizeram de Der Mann Ohne Eigenschaften um retrato definitivo do homem moderno -, devo restringir-me a traçar um painel de esboços imperfeitos e fragmentários, em lugar de tentar reproduzir uma imagem completa. O máximo que posso esperar obter é um kit identitário, um retrato compósito capaz de conter tanto lacunas e espaços em branco quanto seções completas. Mesmo essa composição final, contudo, será um trabalho inacabado, a ser concluído pelos leitores".
Entretanto, considerando que a previdência me nomina, o que coloco, acima de tudo, é: será que o que irrompe, às vezes de uma forma aparentemente cruel, nos fazendo conviver com um terrorismo intermitente, sempre possível de vir à tona, é assim tão imprevisível? De certa forma, a grande lição que tivemos até aqui, a qual foi muito bem dita por Freud, cuida do diálogo do sujeito frente às suas escolhas, mesmo aquelas que são tomadas a partir de um lugar outro, às vezes revestidas de um véu que se pretende inconsciente.
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Um comentário:
Você escreve cada vez melhor. Sua poesia é interessante; mas a poesia de sua prosa é linda.
Murilo
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